terça-feira, 27 de abril de 2010


Ele revirou mais alguns discos velhos, separou umas fotografias amareladas, se sentou próximo a janela com sua taça de vinho tinto e suspirou relaxado, como se aquilo fosse o êxtase para um final de dia cheio. Ela permaneceu imóvel, observando tudo do sofá próximo a porta, se sentia tão distante daquilo e ao mesmo tempo tão presente, sabia que tinha em suas mãos tudo para ser feliz mas se sentia plena de absolutamente nada. Tinha tudo e nada. Ele sorriu, cantarolou alguma coisa em inglês como se estivesse prestes a sair dançando alguma cena de Fred Astaire pela sala bagunçada. Ela observou, imóvel, indiferente. Sua vontade no fundo era tirá-lo para dançar sobre o tapete gasto, esquecer o mundo por uns instantes e se fazer de bêbada sem pudor algum. Mas sua imaginação continuou calada sobre cenas remotas e distantes. Permaneceram assim por mais alguns segundos, ele na janela, ela próxima a porta. Até que ele decidiu se juntar a ela, tirar-lhe o cabelo do rosto, acariciar-lhe as orelhas. E ela percebeu que tinha alguém, que estava feliz, mas sua imaginação gritou-lhe que estava sozinha. Tinha alguém mas estava sozinha. Ele observava ela, ela observava o nada. A música no fundo começava aos poucos a criar uma trilha sonora para uma cena obsoleta, incompreensível. Ele se aproximou, encostou sua testa na dela e fechou os olhos, certamente pensou em beijá-la, abraçá-la, senti-la. Ela fechou os olhos, quis beijá-lo e permaneceu imóvel. Pensou, neste instante, que tinha tudo e não tinha nada.


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